O Dilúvio de Gênesis vs. Lendas de Dilúvio

A plausibilidade, consistência interna e confiabilidade do relato do dilúvio histórico encontrado no livro de Gênesis em comparação com outras narrativas de dilúvio do Antigo Oriente

de Troy Lacey e Lee Anderson, Jr. em Novembro 3, 2023
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“O Dilúvio descrito no livro de Gênesis é apenas um entre muitos mitos antigos”. Você já ouviu alguém dizer isso? Não é difícil demonstrar a falsidade dessa afirmação. Podemos, por meio de uma resposta que destaca a majestade do relato histórico de Deus, mostrar que todos os mitos antigos afundam num mar de irrelevância.u para pensar sobre o dilúvio da época de Noé e sua relevância para a questão da idade da terra, independentemente de eles aceitarem ou não a noção de milhões de anos.

Quando exploradores britânicos descobriram a biblioteca antiga do rei assírio Assurbanipal entre os anos 1852-1853, encontraram entre as preciosas tábuas de argila uma cópia da Epopeia de Gilgamés, uma obra babilônica. Depois de ser traduzido pela primeira vez no ano 1872, seu conteúdo chocou a comunidade acadêmica, devido à sua semelhança com partes do livro de Gênesis, especialmente aqueles trechos sobre o relato do Dilúvio. Aliás, muitos acadêmicos acusaram a Bíblia de ter feito uma simples re-narração da epopeia.

A Epopeia de Gilgamés é um longo poema que descreve uma advertência sobre uma inundação vindoura. Ela narra que um homem foi escolhido para construir um barco com uma só porta, foram reunidos animais, caíram chuvas torrenciais, o homem mandou uma pomba e um corvo, o barco foi parar numa montanha e o homem mostrou seu agradecimento oferecendo sacrifícios. Há alguma validez na afirmação de que o Dilúvio do livro de Gênesis é apenas um entre muitos mitos, talvez até mesmo uma versão plagiada do relato babilônico?

A melhor forma de responder a essa pergunta é analisar os detalhes. O que a Bíblia realmente ensina sobre o Dilúvio, e como isso se compara com os mitos fabricados pelos homens? Moisés descreveu eventos que realmente aconteceram, ou simplesmente procurou ensinar uma lição moral ou parábola? Se a Bíblia é a Palavra de Deus (2 Timóteo 3:16-17), a verdade (João 17:17) e uma luz que nos guia (Salmo 119:105), os cristãos devem poder discernir a intenção original do autor depois de um estudo cuidadoso e com a ajuda do Espírito Santo.

O livro de Gênesis, escrito no estilo de narrativa histórica, é muito superior a qualquer mito. Um bom conhecimento do relato do Dilúvio é suficiente para poder mostrar aos outros que ele ofusca todos os mitos de dilúvio que foram inventados pelo homem, inclusive a versão babilônica, que é a mais parecida com a bíblica.

Uma Lenda Fabricada pelo Homem ou um Relato Histórico Divinamente Registrado?

A Epopeia de Gilgamés, uma epopeia babilônica escrita em 12 tábuas, foi escrita no século XVIII antes de Cristo (mais ou menos dois séculos antes do nascimento de Moisés, durante o cativeiro dos hebreus no Egito), mas os acadêmicos consideram que trecho que descreve o dilúvio foi adicionado mais tarde. Gilgamés, um rei-guerreiro, vive uma série de aventuras em busca da vida eterna. O final da tábua 10 e início da tábua 11 descrevem como ele viaja a uma terra longínqua para se encontrar com Utnapistim e sua esposa, que muito antes tinham construído um barco a fim de sobreviver a uma inundação global que tinha exterminado toda a humanidade, exceto a pequena remanescente no barco. (Muita dessa informação também foi registrada na Epopeia de Atracasis, um poema acadiano ainda mais antigo que inclui outros detalhes explicados abaixo.)

Este poema é exatamente o que é afirmado no título: uma epopeia. O poeta inventou uma história fictícia cujo propósito era entreter o seu público. O texto emprega elevados recursos poéticos, como dísticos facilmente memorizados e frases feitas, que os ouvintes esperavam encontrar em obras desse gênero. Nenhum ouvinte esperava que a história fosse entendida como um relato histórico literal.

Ao contrário da Epopeia de Gilgamés, o livro de Gênesis apresenta cada detalhe do Dilúvio como um registro histórico que deve ser levado a sério. A Bíblia afirma ser um livro divinamente inspirado (2 Timóteo 3:16-17), e uma vez que Deus não pode mentir, esperamos que qualquer afirmação sobre a história feita por Ele seja verdade. Diferentemente dos mitos, a Bíblia registra de forma minuciosa detalhes específicos sobre as culturas da antiguidade, e também reconhece os fracassos de seus “heróis”. É muito incomum encontrar esse grau de honestidade e atenção com os detalhes na mitologia antiga, embora essas características sejam muito apropriadas num relato histórico genuíno.

No que diz respeito ao Dilúvio, a linguagem usada em Gênesis 6-9 é tão descritiva e prática quando narra os detalhes sobre o que Deus fez e como Noé lhe obedeceu que não deixa espaço para considerar esses capítulos uma obra alegórica ou mitológica. Embora seu estilo e estrutura literária sejam extremamente sofisticados, o relato de Gênesis evita a maioria dos recursos poéticos que caracterizavam as epopeias do Antigo Oriente e do Antigo Egito.

Além disso, o resto das Escrituras consideram que os eventos narrados em Gênesis 6-9 são fatos históricos. Por exemplo, de acordo com os registros do escritor de 1 Crônicas, Noé foi o antepassado de Abraão (1 Crônicas 1:4, 1:27). Quando Jesus menciona Noé, Ele o trata como um personagem histórico real e o Dilúvio como um evento histórico real (Mateus 24:37-39). Lucas inclui Noé na genealogia de Cristo (Lucas 3:36), e Pedro menciona duas vezes que Noé construiu a Arca e foi um de somente oito pessoas cujas vidas foram preservadas (1 Pedro 3:20; 2 Pedro 2:5).

Plausibilidade

Compare a plausibilidade da Epopeia de Gilgamés com a do relato bíblico.

Enqui, o deus da sabedoria e das artesanias, adverte Utnapistim (a figura babilônica que corresponde a Noé) sobre uma inundação vindoura e lhe dá instruções para desmontar sua casa feita de juncos e construir um grande barco com a forma de um cubo. No entanto, uma nave com essa forma não seria apta para navegar, e viraria com facilidade.

O barco foi construído em menos de sete dias, durante os quais Utnapistim também teve que reunir os animais de todas as partes da terra. O dilúvio durou apenas sete dias, mas mesmo assim foi o suficiente para cobrir a terra. Depois de uma semana de chuvas, o mar e o vento se acalmaram e o barco foi parar no monte Nimush.

Ao contrário do barco com sua forma absurda que foi construída durante um período irrealisticamente curto que encontramos na epopeia, os detalhes práticos que vemos na Bíblia são bastante razoáveis. Deus deu a Noé instruções para a construir uma Arca retangular cuja boa adequação para a navegação já foi comprovada de maneira experimental. Noé também recebeu sua advertência muito antes (talvez mais de um século) do evento. Além disso, quem trouxe os animais à Arca foi Deus, e não Noé.

A Bíblia menciona alguns dos mecanismos naturais que foram responsáveis por essa inundação da terra, incluindo a abertura das fontes das grandes profundezas e das comportas do céu (Gênesis 7:11). Esses mecanismos fizeram com que o Dilúvio durasse mais de um ano, um período muito mais verossímil do que a tempestade de sete dias descrita na Epopeia de Gilgamés.

Coerência Interna

Embora a Epopeia de Gilgamés seja divertida, ela carece de uma coerência interna. Por exemplo, os deuses decidem de maneira arbitrária destruir a vida com uma inundação, mas depois decidem conceder a vida eterna a Utnapistim. Essa inconstância é uma característica típica dos deuses. De maneira pouco responsável, usam seu poder para exterminar a maioria dos humanos, mas depois se arrependem, pois a narrativa nos informa que eles dependiam do alimento que recebiam dos sacrifícios oferecidos por humanos! Tais inconsistências que aparecem no mito dificultam a busca de um tema unificador que lhe dê sentido, ou até mesmo credibilidade.

Em comparação, o relato bíblico apresenta uma coerência interna impressionante. O eixo do relato como um todo é uma declaração sumamente significativa: “Então Deus lembrou-se de Noé…” (Gênesis 8:1). Antes dessa declaração, cada detalhe do relato mostra como Deus trouxe destruição sobre o mundo a cada passo, e ao mesmo tempo proporcionou a Noé um meio de salvação. Depois de Gênesis 8:1, cada detalhe mostra como Deus trouxe renovação a cada passo a um mundo arrasado, ao mesmo tempo que mostra Sua fidelidade ao Seu pacto com Noé (Gênesis 6:18; 9:9-17).

Uma Melhor Mensagem

Há uma razão pela qual, hoje, mais de dois bilhões de pessoas dizem que creem na Bíblia, enquanto ninguém adora os deuses da Epopeia de Gilgamés. As Escrituras revelam um Deus que é infinitamente melhor que os deuses do Antigo Oriente, e que faz muito mais que esses deuses para satisfazer os anseios do ser humano. As diferenças são profundas e intransponíveis.

O herói da Epopeia de Gilgamés é um homem a quem os deuses concedem imortalidade; os deuses são pecadores, corruptos e desprezíveis. O herói no relato bíblico é Deus, que preserva a humanidade. É Ele que se lembra de Noé (Gênesis 8:1) e põe fim à catástrofe. Por outro lado, os pecadores são os seres humanos. Inclusive o protagonista humano, Noé, mais tarde sucumbe à bebedice e é desonrado. A Bíblia, ao contrário dos mitos fabricados pelos homens, coloca Deus e os homens nos seus devidos lugares.

Que Tipos de Deuses São Esses?

Na Epopeia de Gilgamés, o concílio dos deuses decide destruir a humanidade simplesmente devido à superpopulação da terra por mortais (de acordo com a versão acadiana mais antiga do mito).1 Enlil, o deus da tempestade que tinha criado o homem, fica irritado com os humanos por fazerem tanto barulho que atrapalhavam o seu sono. Por isso, ele foi o autor da decisão tomada pelo concílio. Mas Enqui, outro deus, adverte Utnapistim em segredo.

Com a chegada das chuvas, os deuses ficam tão apavorados que fogem dos céus inferiores, temendo que a tempestade atinja suas próprias moradas. Esses deuses acobardados começam a chorar ao testemunhar a morte de seus seguidores, arrependidos dos eventos que eles mesmos desencadearam.

Quando Utnapistim apresenta um sacrifício aos deuses, estes se reúnem como moscas ao redor dele. (Na epopeia ainda mais antiga de Atracasis, os deuses famintos, que tinham ficado uma semana sem comer, descem para consumir a oferta.)

Os deuses são caprichosos, covardes e dependentes dos humanos para receberem adoração e alimento. Uma vez que os deuses não podem eliminar o barulho produzido pelos homens, são obrigados a buscar formas de reduzir a população humana.

O Deus da Bíblia é Infinitamente Superior!

O relato de Gênesis é muito claro ao expor o problema. Deus traz juízo sobre a terra inteira porque o pecado do homem a tem corrompido. Deus está no controle de cada aspecto do Dilúvio. Em vez de ficar com medo dele, Ele usa os elementos para trazer juízo e justiça. Uma vez que Deus não precisa de nada da parte do homem (Atos 17:25), sua motivação ao preservar Noé não foi egoísta. O Deus justo e santo castiga o pecado, mas também decide mostrar bondade e misericórdia (Salmo 8:4-5, 145:8-9).

Enquanto os babilônios acreditavam que os deuses decidiram criar os homens para realizarem suas tarefas servis, o livro de Gênesis revela que Deus criou o homem à Sua própria imagem com o privilégio de governar como administrador sobre Sua criação. Quando Noé e sua família saíram da Arca, Deus os abençoou, dando-lhes instruções para encherem a terra. Em comparação, os deuses da Epopeia de Gilgaméa pensaram em novas maneiras cruéis de limitar a população humana, inclusive depois do dilúvio.

A narrativa em Gênesis sobre o Dilúvio é um desafio direto que desacredita os mitos pagãos da época.

Em cada aspecto, a narrativa apresentada na Bíblia é superior aos mitos e lendas babilônicos. O autor transmite um relato histórico genuíno que aconteceu num ponto específico da história (e não no mundo nebuloso das lendas), mostrando que o evento planificado por Deus foi caracterizado por Sua previdência para a preservação de pessoas e animais.

É difícil não chegar à conclusão de que o autor de Gênesis tinha consciência da lenda babilônica de Utnapistim. (Afinal, Moisés, a quem a Bíblia atribui a autoria do livro de Gênesis, teria tido à sua disposição documentos do mundo inteiro na biblioteca real do Egito.) Seja ou não de forma intencional, a narrativa em Gênesis sobre o Dilúvio é um desafio direto que desacredita as ridículas ideias pagãs que eram populares na época.

De Onde Vieram os Mitos de Dilúvio?

Qualquer pessoa que acuse a Bíblia de simplesmente reproduzir “mais um mito de dilúvio” precisa examinar mais de perto os diversos mitos de dilúvio das várias regiões do mundo. Os antropólogos já identificaram dezenas deles, mas muitos estão cheios de detalhes extravagantes que pouco têm a ver com a Bíblia.

A maioria das semelhanças são superficiais e facilmente explicadas. Afinal, a maioria das culturas tiveram acesso à versão do Dilúvio encontrada na Bíblia. Mesmo que não tivesse uma Bíblia, um contador de histórias teria incorporado muitos dos mesmos detalhes numa história sobre uma inundação. (Por exemplo, um barco é um bom meio de preservação, e pelo menos uma pessoa precisa sobreviver para poder transmitir a história.)

Salvo a versão babilônica, todos os mitos de dilúvio que conhecemos foram escritos muito tempo após o livro de Gênesis. Alguns foram registrados antes do nascimento de Cristo em lugares como Grécia (no século V a.C.), Índia (no século IV a.C.) e China (no século IV a.C.). Mas a maioria dos mitos não foram registrados até a era moderna, muito após as atividades de missionários, comerciantes e conquistadores que difundiram a cultura e influência ocidental pelo mundo inteiro.

O mito dos babilônios é o único cuja semelhança com o relato bíblico é significativa. (A tábua babilônica é do século XVIII a.C., e Moisés escreveu o livro de Gênesis no século XV a.C.). As semelhanças fazem sentido se considerarmos que ambas versões foram escritas pouco tempo depois do evento que descrevem. Por outro lado, aqueles mitos que foram escritos mais tarde pouco têm a ver com a Bíblia. Por exemplo, de acordo com o mito chinês, o dilúvio foi causado por um argumento entre um caranguejo e um pássaro!

Os cristãos podem declarar com confiança que a Bíblia é infinitamente superior a qualquer mito, exatamente o que esperamos à luz da infalibilidade do seu Autor.

Mapa De Alguns Dos Mitos De Dilúvio Encontrados No Mundo

Map of Flood Myths

Vermelha: Contém algumas semelhanças com a Bíblia (os deuses favorecem o sobrevivente)
Azul: Mais parecido com a Bíblia (o barco pousa numa montanha)
Verde: Pouco parecido com a Bíblia (a água traz uma destruição generalizada)

Troy Lacey é graduado em ciências naturais (biologia/geologia) da Universidade de Cincinnati. Ele é o representante de correspondência e coordenador de serviços de capelania em Respostas em Gênesis - EUA.

Footnotes

  1. Stephanie Dalley, Myths From Mesopotamia: Creation, The Flood, Gilgamesh and Others (Oxford: Oxford Univeristy Press), pp. 105–135.

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